Entrevista com o Autor


Dr. Eduardo Arruda Alvim
em 24/05/2007

Atualidades do Processo Civil

Eduardo Arruda Alvim é Advogado do escritório Arruda Alvim e Thereza Alvim Advocacia e Consultoria Jurídica com atuação em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília; Professor da PUCSP (graduação e especialização) e da Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo – Fadisp; membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual. Coordenador, junto com o Prof. Arruda Alvim, das obras "Revista Autônoma de Processo - Número 1 - Doutrina, Atualidades, Pareceres, Direito Vivo Comentado", "Revista Autônoma de Processo - Número 2 - • Doutrina • Atualidades • Pareceres • Direito Vivo Comentado", "Atualidades do Processo Civil - Incluindo as Últimas Reformas das Leis 11.187/05, 11.232/05, 11.276/06, 11.277/06 e 11.280/06" e "Licitações e Contratos Administrativos - Uma Visão Atual à Luz dos Tribunais de Contas".

1- O senhor acredita que a maneira como está sendo adotada a Reforma Processual, por meio da edição de leis e a consequente modificação de artigos esparsos do Código de Processo Civil, tem se mostrado equivocada?
R:
Não, acho que temos um bom Código, que carece(ia) de algumas modificações, que vêm sendo adequadamente implementadas nos últimos anos. Penso porém que o grande problema, pelo menos no que diz respeito à tão falada demora do processo, não reside nas leis, mas na necessidade de uma mudança na forma de administração do processo, o que vem sendo defendido por alguns autores eminentes, como o Prof. Luiz Rodrigues Wambier. Há necessidade de serem detectados os pontos de estrangulamento que implicam uma demora exagerada, em que o processo não está nem com as partes, nem com o magistrado. Este trabalho, se bem executado, poderá surtir resultados tão ou mais frutíferos do que as reformas.

2- A Lei 11.187/05 demonstrou a preocupação do legislador com a celeridade processual. Após as mudanças ocorridas, é possível afirmar que o recurso de agravo retido, por um lado, provocou o desafogamento dos Tribunais e de outro, trouxe prejuízo significativo aos jurisdicionados, uma vez que não mais possuem a oportunidade para reverter de imediato, as decisões interlocutórias que lhes são desfavoráveis?
R:
A prática tem demonstrado, segundo penso, que há (havia) um número exagerado de agravos de instrumento. Há(havia) processos em que mesmo antes da sentença são(eram) interpostos dez, doze agravos. Isso, em princípio, não sentido, e desfigura a função dos tribunais locais, que são eminentemente tribunais de apelação. Nesse sentido, as modificações introduzidas pela Lei 11.187/05, segundo me parece, são saudáveis e merecem o aplauso da comunidade jurídica.

3- Na sua opinião, o recurso de agravo retido na forma oral, tem gerado polêmica, criando situações de conflitos como por exemplo quanto ao tratamento das partes, diante de um mesmo processo?
R:
Não penso dessa forma. Pelo contrário, acho que as manifestações orais são bastante úteis nesses casos.

4- Ainda com relação ao recurso de agravo retido na forma oral, o senhor concorda com o entendimento que o legislador, de forma afoita e equivocada, acabou criando um novo prazo recursal, o prazo “à vista”, no próprio ato, quando a parte prejudicada terá poucos minutos até o encerramento do termo de audiência, para manifestar seu inconformismo?
R:
O prazo “à vista” pode, sim, representar sob determinado ponto-de-vista, um problema. Penso que os gargalos de estrangulamento do processo não são propriamente os prazos processuais, mas o tempo que o processo fica parado, conforme respondi acima (pergunta 1). Mas, acho que o estímulo à oralidade é importante e compensa quaisquer inconvenientes.

5- Com a alteração da redação do Art. 504 do Código de Processo Civil pela Lei 11.276/06, todos os despachos tornaram-se irrecorríveis. A problemática está justamente no fato que alguns deles trazem a análise de requisitos estabelecidos na lei e até de fatos contidos no próprio processo que podem causar um prejuízo patente à parte. Parece evidente que a nova redação retira direitos processuais das partes. Qual o posicionamento do senhor diante da nova redação do Art. 504?
R:
Parece-me que a regra do art.504, agora com a redação dada pela Lei 11.276/06, tem um cunho meramente expletivo. Despachos são irrecorríveis porque não tem potencialidade lesiva. Se tiverem potencialidade lesiva, então não são despachos, mas decisões interlocutórias, recorríveis nos termos do art.522 do CPC. Esta, a posição do Prof. Nelson Nery Jr, que me sirvo de acompanhar. Interpretado dessa forma, o art.504 não parece trazer quaisquer problemas.

6- O § 4º do Art. 515, atribui competência ao tribunal para realizar determinados atos corretivos, sanando as nulidades relativas existentes, visando claramente a celeridade do processo. Essa atribuição de competência tem surtido efeito ou elementos estabelecidos além das intenções do legislador têm agido para que se torne inócua?
R:
Penso que a inserção do §4º do art.515 é salutar e, ao contrário, favorece a celeridade, se bem aplicado, é claro. Detectada a necessidade de determinada providência, converte-se o julgamento em diligência, sem prejuízo da sentença já proferida objeto da apelação. Desde que se trate de nulidade sanável, tenho que esse preceito só favorece a celeridade processual.

7- Segundo a redação do §1º do Art. 518, o juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal. Essa medida à primeira vista, parece tirar a própria razão de ser do recurso, uma vez que este existe justamente para evitar que um juiz, isoladamente, cometendo um erro na avaliação do direito da parte, acarrete-lhe prejuízos. Como o senhor entende essa inovação?
R:
Não vejo esse preceito como tendo caráter impositivo. Parece que o juiz “poderá” aplicá-lo, pois o mesmo não envolve a aplicação de súmula vinculante. Acho, todavia, que precedentes jurisprudenciais, principalmente quando sumulados pelas Cortes encarregadas pelo texto constitucional de dizer a última palavra em matéria constitucional (STF) e em matéria de lei federal (STJ), devem ser seguidos. Como magistrado, não hesitaria em observá-los, mesmo quando desprovidos de caráter vinculante. Só uma má compreensão do princípio da persuasão racional (CPC, art.131) leva na minha concepção a entendimento diferente. Visto desse prisma, simpatizo com o §1º do art.518, que, em verdade, consubstancia importante inovação, pois o magistrado pode negar seguimento ao recurso, não porque lhe falte este ou aquele pressuposto de admissibilidade, mas em razão do mérito deste contrariar Súmula do STF ou do STJ.

8- Talvez a mais sensível alteração trazida pela Lei 11.232/05, tenha sido a extinção do processo de execução por quantia certa fundada em título judicial, passando este a ser apenas uma fase executória dentro do processo inicial. O senhor acredita que essa medida trouxe celeridade ao processo e valorizou a figura do credor?
R:
Não tenho observado na ordem prática uma grande repercussão na celeridade processual das modificações introduzidas pela Lei 11.232/05. A mais importante delas, que tem feito o devedor pensar duas vezes em seguir adiante em discussões infundadas, é a multa de 10% do art.475-J. Esta tem exercido um papel psicológico importante no sentido de evitar discussões inúteis, contribuindo para o desafogamento do Judiciário como um todo.

9- Com relação às novas tendências do Processo Civil, qual seu posicionamento diante da possibilidade de saneamento do processo em segunda instância e com relação à tutela de obrigação específica e as hipóteses de incidência da multa como meio de busca da efetividade?
R:
A incidência de multa – aliás, a mais importante das reformas processuais, segundo penso, foi aquela que alterou o art.461, introduzindo a possibilidade de imposição de multa, que a meu ver incide não apenas no caso das obrigações de fazer e de não fazer, mas também em casos excepcionais aplica-se ao art.273 — é fundamental para que o Judiciário faça valer na ordem prática suas decisões. Sou inteiramente favorável às “astreintes” como meio de coerção psicológica do mau devedor. Vou mais longe. Penso que o desrespeito às ordens do Judiciário (“contempt of court”) deveria ensejar não apenas multa (e no caso da multa do art.461, §§4º e 5º tem-se que esta tem caráter cominatório, de modo que parece-me perfeitamente cumulável com a multa sancionatória do art.14, p.u., ambos do CPC), mas prisão. Não sou adepto, deixe-se bem claro, da prisão civil, vedada pelo texto constitucional em cláusula pétrea. Sou favorável à prisão por descumprimento de ordem judicial, como sempre defendeu a eminente Professora Ada Pellegrini Grinover.